Abarth Simca no Brasil Seg, 03 de Dezembro de 2007 00:00 - Escrito por Napoleão Ribeiro
http://www.luik.com.br/Fundada em 5 de maio de 1958, a Simca do Brasil logo se interessaria pelas corridas de automóveis, consideradas à época como grande poder de marketing para os fabricantes de automóveis.
Em 1960 foi criada uma categoria de carros Turismo Nacional, mais conhecida como Turismo GEIA, sigla que significava Grupo Executivo da Indústria Automobilística, grupo criado pelo Presidente da República Juscelino Kubitschek para implementação da indústria no país.
Desde a primeira prova, dessa nova categoria, ocorrida em Brasília, por ocasião da inauguração da cidade, a Simca começou a participar embora, sem formar uma equipe devidamente estruturada.
A estruturação da equipe de competição começou nas Mil Milhas disputadas em 26 de novembro de 1961, quando três Simca Chambord pintados de vermelho e pilotados por Ciro Cayres/Danilo Lemos; Waldemyr Costa/Waldemar Costa Fº; e Jayme Silva/Lauro Bezerra participaram da prova.
Ciro Cayres chegou ocupar o segundo lugar, na parte final da prova, logo atrás do Corvette de Orlando Menegaz/Ítalo Bertão, que venceria a prova, mas problemas no filtro de óleo fizeram-no abandonar a corrida faltando menos de 20 voltas para o seu término.
Tendo George Perrot como Chefe do Departamento de Competições e Ciro Cayres e Jayme Silva como principais pilotos, a equipe passou a disputar regularmente as competições a partir de 1962, entretanto os carros fabricados no Brasil não eram os mais indicados para competição e, com exceção da vitória obtida pela “Carretera” de teto rebaixado nos 1600 Km de Interlagos de 1963, os resultados não eram dos melhores.
A partir de 1962 as principais corridas nacionais passaram a ser disputadas por carros Turismo e Grã-turismo nacionais e importados e os Interlagos, da equipe oficial da Willys, dominavam amplamente o automobilismo nacional.
Em 1964 começaram a ser importados novos carros. Primeiro foi o Porsche Carrera 2 de Marivaldo Fernandes; logo depois foi uma Alfa Romeo Giulia TIS de Piero Gancia; e em seguida um Fiat Abarth 850 TC de Eugênio Martins e Paulo Goulart.
A chegada desses novos carros, além de ameaçar a supremacia dos Interlagos, deixava os Simca em grande desvantagem.
Diante desse quadro, George Perrot convenceu o Presidente Jacques Pasteur a montar uma equipe realmente competitiva.
O primeiro passo foi construir um protótipo com mecânica do Simca nacional, a partir do chassi da Maserati 250F de Ciro Cayres, chamado de Simca TGT, que mais tarde seria conhecido como “Tempestade”, numa alusão às dificuldades de condução e ao Simca Tufão.
Paralelamente à construção do protótipo, Ciro Cayres e George Perrot foram para a França comprar três Abarth Simca 2000, carro esportivo que tinha sido lançado recentemente e que começava a ter seu desempenho destacado no automobilismo europeu.
Os Abarth eram carros muito bem construídos pelo renomado preparador de carros de corrida italiano Carlo Abarth. Com carroceria tipo berlineta, rodas de liga leve, novidade para a época, motor com cabeçote de alumínio, duplo comando de válvulas, 2000 cm³, câmbio de 4 ou 6 marchas, tinha tudo para tornar-se sucesso no país.
Foram trazidos para o Brasil três desses carros, os chassis nºs 136/0080, 136/0085 e 136/0090, na condição de carros de teste, ou seja, deveriam permanecer no país por um determinado tempo e depois disso retornarem à origem.
Desde sua chegada, os carros foram envolvidos em polêmica sobre a forma como foram trazidos e a liberação alfandegária somente foi possível mediante liminar judicial.
A questão se transformou em uma “marca” que pesou sobre os carros durante o período de pouco mais de um ano que permaneceram no Brasil.
Muitos atribuem essa dificuldade a manobras da equipe Willys, que na época estava importando, para substituir o Interlagos, três Alpine A-110 com motor do Renault R-8 de 1.100 cc e que, com a vinda dos Abarth, teriam poucas chances.
Os Abarth estrearam nas 3 Horas de Velocidade, em Interlagos, no dia 30 de agosto de 1964. O carro de Ciro Cayres se apresentou com câmbio de 6 marchas e o de Jayme Silva de 4 marchas. Durante a corrida o que se viu em Interlagos foi um “passeio” dos dois carros vermelhos da equipe Simca. Ciro se manteve à frente, mas faltando cerca de 10 minutos para o final da corrida, teve que parar nos boxes para reparar as luzes traseiras que tinham apagado. Perdeu 3 minutos parado e a liderança para Jayme Silva no outro Abarth. Na última volta, Jayme Silva quase parou o seu carro no retão para esperar seu companheiro de equipe e receberem a bandeirada de chegada lado a lado, com ligeira vantagem para Jayme.
Os Interlagos demonstraram que não tinham a menor chance contra os novos carros da Simca. Nem Bird Clemente, com um desempenho próximo da perfeição, foi capaz de oferecer a mínima oposição, conseguindo apenas ficar na mesma volta dos líderes.
Uma semana depois os Abarth se apresentavam para a disputa dos 500 Km de Interlagos. Dessa feita os dois carros estavam equipados com câmbio de 4 marchas e pilotados por Jayme Silva e Fernando “Toco” Martins. Ciro Cayres preferiu competir com o Simca protótipo ao lado de Ubaldo Lolli, devendo se revezar também no Abarth de “Toco”.
Jayme Silva liderou a prova com grande facilidade até parar na 18ª volta com a quebra da transmissão. “Toco” assumiu a liderança sendo substituído por Ciro Cayres ao final da prova. Luiz Pereira Bueno foi o segundo colocado com três voltas de desvantagem para o vencedor enquanto que Bird Clemente, com um balancim do motor do seu Interlagos quebrado, foi apenas o quarto colocado.
Em novembro a equipe Simca ganhou um novo reforço: a contratação de Chico Landi para chefiar a equipe. A estréia de Landi aconteceu em 29 de novembro por ocasião da disputa da prova “6 Horas de Brasília”.
Foi uma prova tecnicamente muito pobre com a participação de apenas onze carros, entre eles os dois Abarth e o Simca Tempestade.
Com toda essa facilidade, Chico Landi resolveu promover a vitória do carro nacional e com isso, apesar da superioridade dos Abarth, o vencedor acabou sendo o Simca Tempestade de Ciro Cayres e Ubaldo Lolli. Curiosamente, durante a prova, Jayme Silva chegou a parar seu carro no circuito, comprar e saborear um picolé, enquanto aguardava ser ultrapassado pelo carro de Ciro, para depois retornar.
Se o sucesso do carro nas pistas era total, as dificuldades burocráticas quanto à permanência no país continuavam.
Independentemente disso, os Abarth se apresentaram novamente em Brasília, em abril de 1965 para a disputada da prova de 12 Horas. Prevista para acontecer na madrugada de sábado para domingo, a corrida somente foi realizada de segunda para terça-feira depois de uma luta judicial entre o Automóvel Clube do Brasil e a Confederação Brasileira de Automobilismo.
Durante a prova os dois Abarth não tiveram adversários e se impuseram aos demais participantes, ocupando os dois primeiro lugares durante a primeira hora de corrida, quando o carro de número 44 começou a enfrentar problemas com o dínamo (naquela época ainda não existiam os atuais alternadores de voltagem nos carros), sendo obrigado a parar constantemente para trocar a bateria.
Quando o dia clareou, sem precisar dos faróis, a bateria passou a ser menos exigida e com isso o Abarth começou sua recuperação, quebrando constantemente o recorde de volta. Porém acabou terminando a prova na terceira posição. O vencedor foi o Abarth de Jayme Silva/”Toco” Martins, o segundo colocado o Interlagos de Wilson Fittipaldi Jr./Bird Clemente/Luís Pereira Bueno/José Carlos Pace com cinco voltas de atraso e, o terceiro, o Abarth de Ciro Cayres/Ubaldo Lolli, uma volta atrás.
No dia 16 de maio os Abarth estavam presentes aos “500 Km da Guanabara”, prova disputada no circuito da Barra da Tijuca no Rio de Janeiro.
Mais uma vez, no carro nº 26 estavam Jayme Silva/Fernando “Toco” Martins e no nº 44 Ciro Cayres/Ubaldo Lolli. O Simca TGT seria conduzido por Ciro Cayres/Jayme Silva/Pedro Jaú.
Na corrida estavam presentes os novos DKW Malzoni e o Alpine A-110, ainda equipado com motor de 1.100 cc.
A largada aconteceu debaixo de chuva e, ao final de quase 4 horas e meia de corrida, para surpresa geral, o vencedor foi o Simca TGT, ficando o Abarth nº 26 em segundo, duas voltas atrás. O 44 abandonou com seu crônico problema de transmissão.
Uma semana depois foi disputada a prova 12 Horas de Interlagos. Nessa corrida o Abarth de Jayme Silva/Fernando “Toco” Martins, mesmo sofrendo com os buracos da pista de Interlagos, manteve a sua superioridade, enquanto que o carro nº 44 sucumbia com a suspensão quebrada.
Em 6 de junho os dois Abarth foram levados para disputar a II Etapa do Campeonato Carioca no circuito da Ilha do Fundão.
Com apenas 6 carros na prova, registrou-se a vitória do carro nº 44 de Ciro Cayres. Dessa vez foi o nº 26 que apresentou problemas de transmissão e teve que abandonar.
No dia 20 de junho de 1965 foi disputada a prova “6 Horas de Interlagos”. Essa competição era disputada em três baterias de duas horas com a soma dos tempos indicando o vencedor final.
A primeira bateria foi, como de costume, totalmente dominada pelos dois Abarth com Ciro Cayres chegando em primeiro e Jayme Silva em segundo.
Embora tenha liderado a maior parte da segunda bateria, Ciro Cayres acabou abandonando com cerca de uma hora de corrida com problemas de transmissão. Assim, Jayme venceu as duas baterias à frente de um ameaçador DKW Malzoni pilotado por Marinho Camargo.
Em 1965 o terceiro Abarth da equipe foi modificado, se nacionalizando com a substituição do motor original por um motor do Simca Tufão brasileiro. Segundo nos informou Fernando “Toco” Martins, o presidente da Simca do Brasil, Jacques Pasteur, não queria que os três carros corressem juntos e a forma de colocá-los para correr era efetuando sua modificação para competir na categoria de protótipos. Imaginem a dificuldade para substituir um motor 4 cilindros por um V-8, embora de baixa cilindrada, mas que ocupava, evidentemente, mais espaço que o original. O câmbio foi substituído por um de Volkswagen e a frente ganhou uma abertura maior para permitir melhor refrigeração.
A estréia do carro aconteceu no dia 15/08/1965 no “GP Rodovia do Café”, prova organizada por ocasião da inauguração da rodovia que ligava Curitiba a Apucarana, no Paraná.
Disputada em duas etapas, a ida de Curitiba a Apucarana e o retorno, cada uma com pouco mais de 350 quilômetros, teve a participação dos dois Abarth Simca 2000, do Simca TGT e do Abarth Tufão que foi pilotado pelo Chefe do Departamento de Competições da fábrica George Perrot.
No trecho de Curitiba/Apucarana, disputada debaixo de chuva, os dois Abarth Simca deram um show de velocidade, com Jayme Silva em primeiro e Ubaldo Lolli em segundo e o Simca TGT em terceiro. O Abarth Tufão foi apenas o 35º, tendo parado diversas vezes durante o percurso. Na volta, enquanto Jayme vencia com média de 160,646 km/hora, Ubaldo Lolli abandonava no quilômetro 140 com a quebra da transmissão. Na soma dos dois trechos, Jayme ficou em primeiro e Ciro Cayres, no Simca TGT, em 2º. George Perrot com o Abarth Tufão enfrentou diversos problemas, mas mesmo assim terminou a prova na 25ª colocação.
Com o prazo de um ano de permanência dos carros no país vencido, o fisco apertou o cerco. Com isso, no Circuito de Vitória, disputado na Capital Capixaba, apenas o Abarth de Jayme Silva, mediante liminar, esteve presente e venceu a prova, como sempre com grande facilidade, ficando Ciro Cayres em segundo no Simca Tempestade (TGT).
Para a prova, que seria considerada a mais importante do ano, o “GP do IV Centenário da Cidade do Rio de Janeiro”, disputada no circuito da Barra da Tijuca no dia 19/09, os carros somente foram liberados na véspera, novamente mediante liminar judicial.
Assim se apresentaram para a largada os três Abarth: os dois com motor 2000 e o equipado com motor Simca Tufão.
A principal atração da prova foi a Ferrari 250 TR, com carroceria modificada por Piero Drusio, na Itália, para GTO-Drogo, que seria pilotada por Camillo Christófaro.
Camillo largou na pole-position enquanto que os carros da Simca largavam nas últimas posições entre 40 carros, pelo fato de não terem participado dos treinos de classificação.
Jayme no carro nº 26 e Ciro no nº 44 logo se juntaram à Ferrari e os três passaram a disputar as primeiras colocações da prova. “Toco” no Abarth Tufão vinha escalando o pelotão e já estavam bem posicionado porém, acabou capotando na curva do Corsário e ficou fora da prova.
Na 34ª volta Ciro teve que abandonar, com o flexível do óleo rompido e com isso Jayme liderava com confortável vantagem sobre Camillo até que, faltando 3 voltas para o final, o Abarth perdeu uma roda dianteira, entregando a vitória para a Ferrari de Camillo Christófaro.
A despedida dos Abarth das pistas nacionais aconteceu no dia 31 de outubro com a disputa dos “500 Km de Interlagos”.
Mais uma vez os carros só foram liberados pela justiça na véspera da corrida comparecendo para a largada no domingo apenas o Abarth Simca 2000 de Jayme Silva e o Abarth Tufão com Ciro Cayres, ambos largando nas últimas posições.
Rapidamente os dois carros escalaram o pelotão com Jayme assumindo a liderança e Ciro Cayres abandonando depois de 12 voltas, quando ocupava a 3ª colocação e se aproximava da Maserati de Ubaldo Lolli, que ocupava o segundo lugar. Jayme Silva manteve a liderança até o final da prova.
Finalmente o representante da Simca firmou compromisso com a alfândega para que os carros retornassem à Europa.
Nessa época a Chrysler estava assumindo o controle acionário da Simca do Brasil e não demonstrou interesse em manter os carros no país.
Chico Landi ainda tentou uma jogada fazendo com que um piloto peruano se interessasse pelos carros tentando embarcá-los para aquele país para depois retornarem ao Brasil. Entretanto, a manobra não deu certo e os carros foram parar num porto italiano onde permaneceram por longo tempo até serem resgatados por um colecionador.
RELAÇÃO DAS PARTICIPAÇÕES DOS ABARTH SIMCA EM CORRIDAS NACIONAIS:
30/08/1964 - 3 Horas de Velocidade - Interlagos - 26 - Jayme Silva - 1º / 44 - Ciro Cayres - 2º
07/09/1964 - 500 Km de Interlagos - Interlagos - 62 - Fernando Toco Martins/Ciro Cayres - 1º / 26 - Jayme Silva - AB
29/11/1964 - 6 Horas de Brasília - Brasília - Jayme Silva/Fernando Toco Martins - 2º / 44 - Fernando Toco Martins/Marivaldo Fernandes - 3º
26/04/1965 - 12 Horas de Brasília - Brasilia - 26 - Jayme Silva/Fernando Toco Martins - 1º / 44 - Ciro Cayres/Ubaldo Lolli - 3º
16/05/1965 - 500 Km da Guanabara - Rio de Janeiro - 26 - Jayme Silva/Fernando Toco Martins - 2º / 44 - Ciro Cayes/Ubaldo Lolli - AB
23/05/1965 - 12 Horas de Interlagos - Interlagos - 26 - Jayme Silva/Fernando Toco Martins - 1º / 44 - Ciro Cayres Ubaldo Lolli - AB
05/06/1965 - Campeonato Carioca, Ilha do Fundão - 44 - Ciro Cayres - 1º / 26 - Jayme Silva - 4º
20/06/1965 - 6 Horas de Interlagos - Interlagos - 26 - Jayme Silva - 1º / 44 - Ciro Cayres - AB
15/08/1965 - GP Rodovia do Café, Curitiba-Apucarana-Curitiba - 26 - Jayme Silva - 1º / 44 - Ubaldo Lolli - AB / 83 - George Perrot (Abarth Tufão) - 25º
08/09/1965 - Circuito de Vitória - Vitória, ES - 26 - Jayme Silva - 1º
19/09/1965 - GP IV Centenário do Rio de Janeiro - Rio De Janeiro - 26 - Jayme Silva - 4º / 44 - Ciro Cayres - AB / 83 - Fernando Toco Martins (Abarth Tufão) - AB
31/10/1965 - 500 Km de Interlagos - Interlagos - 26 - Jayme Silva - 1º / 83 - Ciro Cayres (Abarth Tufão) - AB
SIMCA TEMPESTADE